Durante um longo período, o gênero de terror na literatura brasileira parecia estar ofuscado pelos grandes autores internacionais. Personalidades como Stephen King, Edgar Allan Poe e H. P. Lovecraft conquistaram as prateleiras dos leitores mais ousados, enquanto os escritores locais buscavam seu lugar sem sucesso no mesmo nível.
Contudo, a situação mudou e, nos anos recentes, a literatura de terror moderna no Brasil começou a se destacar, apresentando novos autores e, sobretudo, um público entusiasmado por histórias de arrepiar que refletem a cultura local.
Raízes assombradas
O Brasil sempre teve uma conexão com o horror. De certo modo, nosso folclore é intrinsecamente obscuro. Seres como a mula sem cabeça, o saci e a cuca marcaram a imaginação de muitas crianças, em narrativas que, apesar de serem vistas como para o público jovem, continham uma verdadeira intensidade de medo.
Escritores como Álvares de Azevedo e Bernardo Guimarães já abordavam temas sombrios no século XIX, porém o terror, como um gênero claramente definido e aceito, levou tempo para se estabelecer amplamente no panorama literário do país, modificando-se ao longo do tempo.
O novo sangue
A mudança começou discretamente, mas agora é impossível não perceber. Uma nova geração de escritores brasileiros está utilizando o terror para debater medos antigos de uma maneira contemporânea. Samir Machado de Machado, André Vianco, Cesar Bravo, Rodrigo de Oliveira, Larissa Prado e muitos outros estão quebrando a ideia de que o terror é apenas algo estrangeiro. Eles demonstram que o medo pode ser igualmente impactante em um condomínio na periferia quanto em uma casa deserta no Maine.
Acima podemos ver um trecho de Caminho do Poço de Lágrimas, de André Vianco.
Além disso, esses escritores estão misturando o terror tradicional com questões sociais: violência nas cidades, desigualdade social, fanatismo religioso, e até os traumas da ditadura militar. Aqui, o monstro ganha uma identidade, documentação e local de residência.
Terror com sotaque e identidade
O que faz o terror contemporâneo brasileiro tão fascinante é a sua habilidade de instigar medo com elementos do dia a dia. É o receio do desconhecido que se oculta nas ruas de uma metrópole, o terror psicológico de quem enfrenta a opressão a cada dia, o sobrenatural que não necessita de explicações, apenas de sensações.
Mais do que apenas sustos, a literatura de terror nacional apresenta convites à reflexão. Ela nos estimula a confrontar nossos próprios demônios, tanto os reais quanto os que nos são imaginários. E faz isso com uma sinceridade que parecia ausente no gênero quando o assunto eram escritores locais.
O papel da internet e dos selos independentes
O aumento da literatura de terror no Brasil deve muito às mídias sociais, aos blogs dedicados, aos podcasts e às editoras independentes. Recursos como o Wattpad e sites de autopublicação possibilitaram que diversos autores encontrassem seu público, sem a necessidade de grandes editoras. Isso possibilitou novas experiências, formatos inovadores e a formação de uma comunidade engajada no gênero.
Eventos literários, feiras do livro e festivais também têm ajudado a promover a literatura de terror brasileira, que agora possui leitores dedicados e cada vez mais criteriosos.
Um futuro sombrio (no melhor sentido)
O Brasil está criando um novo capítulo na história do horror – e ele é de arrepiar. O terror atual produzido aqui já não se preocupa em imitar estilos estrangeiros. Ele desenvolve suas próprias abordagens. E faz isso com habilidade, bravura e uma atenção cuidadosa para os medos que emergem do coração de um país tão multifacetado.
Caso você ainda não tenha explorado o terror moderno nacional, talvez este seja o momento ideal, é sempre bom mergulhar no desconhecido.
Por: David Alves Mendes




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