O medo como manifestação cultural: aquilo que provoca medo no Brasil não é o mesmo que provoca medo no Japão.

Horror - Folclore Japonês e Brasileiro | Horror - Folk Brazilian and Japan

O medo é uma das sensações mais básicas do ser humano. Ele nos oferece proteção, nos avisa e, em determinados momentos, até nos serve de entretenimento — especialmente quando assistimos a um bom filme de terror. No entanto, os fatores que geram esse medo podem variar bastante de um lugar para outro. O que assusta um brasileiro pode não ter o mesmo efeito em um japonês, e o inverso é verdadeiro. O medo, afinal, também se comunica através das culturas.



Lendas que criam temores

No Brasil, histórias como a da Loira do Banheiro, Saci Pererê, Cuca e a aterrorizante Mulher de Branco fazem parte do nosso crescimento. Essas figuras são populares e frequentemente contadas desde pequenos para amedrontar (ou educar) as crianças. 

Horror - Folclore Japonês e Brasileiro | Horror - Folk Brazilian and Japan
Esses seres estão enraizados no nosso folclore e trazem um tipo de medo mais "terreno", associado ao dia a dia, às florestas, às moradias antigas e à espiritualidade.

Já no Japão, o medo é moldado por uma rica tradição de yūrei (espíritos vingativos), maldições e narrativas profundamente ligadas ao xintoísmo e budismo. 

Os fantasmas de cabelos longos e despenteados, como a Sadako, do filme O Chamado, se tornaram quase uma marca registrada do terror japonês. O temor presente nessa cultura está intimamente associado à noção de rituais interrompidos, mortes não solucionadas e à constante presença do mundo espiritual, muitas vezes de maneira silenciosa e passiva até que se torna evidente.


A origem do medo: religião, história e ambiente

As religiões e crenças espirituais desempenham um papel fundamental na forma como o medo é cultivado por uma sociedade. O Brasil, com forte influência da fé católica e das tradições afro-brasileiras, possui um imaginário que combina céu, inferno, demônios e orixás. 

 

Mata Negra - Filme

 

Um filme que me remete a tal ideia, utilizando da religiosidade e do gênero terror é o Mata Negra (2018), do diretor Rodrigo Aragão, abordando um cenário quase que folclórico brasileiro, porém com um teor denso e de maldição, por que não dizer um filme apocalíptico?


 

No Japão, onde o xintoísmo reconhece a presença de espíritos em praticamente tudo — desde árvores até objetos esquecidos — o terror adquire uma nova dimensão. O medo de espíritos vingativos que habitam lares ou pertences abandonados revela uma sensibilidade distinta, mais conectada à ideia de desequilíbrio espiritual e ao peso de emoções não resolvidas.



Silêncio versus histeria
 

Outro aspecto notável é a maneira como o medo é formado e percebido. O terror no Brasil costuma ser explícito, com sustos altos, aparições impactantes e uma trilha sonora que impossibilita qualquer tipo de alívio. O susto é imediato.



O que nos assusta diz muito sobre quem somos

O medo serve como um espelho da sociedade. O que causa medo em uma população expõe suas inquietações, culpas, crenças e traumas coletivos. 

No Brasil, o temor costuma estar relacionado à violência social, à religião e ao folclore. No Japão, o medo reflete o isolamento, a repressão emocional e as forças espirituais que não podem ser desconsideradas.


No final das contas, o medo é algo global, mas sua forma, seu aspecto — e até a maneira como se manifesta na escuridão — varia conforme o local de nascimento. E talvez seja exatamente por isso que o terror seja tão cativante: ele desvenda, nas sutilezas da sombra do medo, quem somos de fato.

 

 Por: David Alves Mendes 

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